domingo, maio 26, 2013

Comentários Eleison: Danação Eterna? - II

Comentários Eleison – por Dom Williamson
CCCVI - (306) 25 de maio de 2013 

DANAÇÃO ETERNA? – II

Se já é inútil pretender que qualquer um de nós seres humanos possa sondar os mistérios de uma simples danação de alma, que se dirá da maioria dos seres humanos que vivem e morrem. Mas há certas coisas a serem ditas que tornam mais fácil aceitar que haja um mistério que transcende a capacidade humana.

A chave para o mistério é certamente a grandeza infinita – ou a condição ilimitada – de Deus. Se Ele é infinito, então ofendê-lO é cometer uma ofensa que é de certo modo ilimitada. Mas o único modo para que um ser humano finito sofra infinitamente é que seu sofrimento não tenha limite ou fim no tempo. Por isso há certa proporção entre alguma grave ofensa cometida contra Deus, e uma punição eterna.

Quanto à infinitude ou condição ilimitada de Deus, não é muito difícil para nossa razão captar no abstrato. Todo efeito que existe em torno de nós requer uma causa. Mas uma cadeia de causas não pode continuar para sempre, assim como uma série interminável de ligações em uma corrente não pode ser pendurada sem um gancho no teto. Então precisa existir uma Causa Primeira, que nós chamamos Deus. Mas se essa Causa Primeira fosse composta, ou posta junta em partes, então quem ou o que quer que a tenha posto junto haveria de ser anterior à Causa Primeira – impossível. Portanto Deus não é de modo algum composto; Ele pode ser apenas simples e pura Existência. Mas a existência não é por ela mesma, como tal, limitada. Qualquer limite sobre o Ser de Deus teria que ter sido posto sobre Ele por um limitador anterior, o que é novamente impossível. Consequentemente a Causa Primeira não tem limites para seu Ser; então Deus é infinita existência.

Na realidade, contudo, não é tão fácil para nossas mentes entender a infinitude de Deus. Nossas mentes humanas estão trabalhando o dia todo, com e a partir de criaturas limitadas ou finitas. Apenas quando nós voltamos nossos corações e mentes para Deus é que estamos pensando no infinito. Daí a dificuldade comum da oração, porque nós só podemos pensar no que é a bondade ilimitada, pensando na bondade limitada em nossa volta, e então pensando além dos limites. Por exemplo, Deus é belo como o pôr do sol, sendo que infinitamente mais belo.
Segue-se que, quanto mais nós permitimos estar imersos na vida diária, menos chances nossas mentes e corações têm de compreender quem ou o quê é Deus por trás de todos os seres limitados que compõem o nosso cotidiano. Ao contrário, quanto mais nós voltamos nossas mentes e corações para conhecer e amar a ilimitada Bondade necessária por trás de todas as boas coisas limitadas de nossas vidas diárias, mais acesso nós teremos ao mistério da bondade infinita de Deus, e ao correspondente mistério de ingratidão de tantas das suas criaturas humanas.

Portanto, ao diminuir – sem que nem de longe haja algum aprofundamento – o mistério da danação eterna das almas, eu preciso seguir o exemplo de São Domingos e rezar. Isso não quer dizer que devo enganar a mim mesmo fingindo que Deus esteja certo quando na verdade está errado. Isso significa minha aproximação com a verdade, ou seja, que Ele está certo e eu -- estou errado!

Os exercícios espirituais de Santo Inácio são de grande ajuda para voltar nossos corações e mentes para Deus. Um santo rezou ao longo dessas linhas: “Ó, Amor, Vós não sois amado. Fôsseis Vós amado. Dai-me apenas amar-vos como Vós necessitais ser amado, e então fazeis comigo o que for da vossa Vontade”.

Kyrie eleison.

sábado, maio 18, 2013

Comentários Eleison: Danação Eterna? - I


Comentários Eleison – por Dom Williamson
CCCV - (305) 18 de maio de 2013



DANAÇÃO ETERNA? – I


Um leitor trouxe à tona mais uma vez um clássico problema que tem sido levantado algumas vezes, diretamente ou indiretamente, nesses “Comentários”. Por se tratar de algo tão sério, merece ser tratado mais uma vez, com destaque. Ele escreve: “Eu acho difícil ser o Católico que eu quero ser por causa da doutrina da danação eterna. Eu não consigo aceitar a ideia de que a alma possa ser atormentada incessantemente por toda a eternidade. É simplesmente muito horrível. Tem que haver alguma doutrina católica que não seja tão rígida.” Em resumo: como pode uma alma ser justamente condenada a uma eternidade de terrível tormento?

Notem que um grande santo como São Domingos passou uma noite agonizando em oração sobre essa questão em uma caverna em Segóvia, na Espanha, que ainda hoje pode ser visitada. Mas deixem-nos estabelecer imediatamente que essa não pode ser uma questão que leve a pôr Deus Todo-Poderoso no banco dos réus, como se Ele merecesse ser condenado ou precisasse de absolvição. Se a Sua Igreja ensina, como o faz, que um pecado mortal pode condenar uma alma ao fogo eterno do inferno, e se eu discordar, então sou eu que estou errado, e não a Sua Igreja. Por que eu estou errado?

Por uma ou ambas destas duas razões que se conectam entre si: ou eu não entendo a grandeza e a bondade de Deus, o que é fácil de acontecer, porque a minha pequena mente é finita e Deus é infinito; ou eu não entendo a gravidade do pecado, o que também é fácil de acontecer porque o pecado ofende a Deus em primeiro lugar, apenas secundariamente a mim e, só em terceiro lugar, ao meu próximo. Então, se eu não consigo entender a grandeza do Deus ofendido pelo pecado, eu naturalmente não entenderei a gravidade do pecado.

A questão passa a ser então: o grande e bom Deus deu a cada ser humano, durante a sua curta vida na Terra, meios suficientes de saber que Ele existe, que Ele pode ficar ofendido, o que basicamente O ofende e quão sério é ofendê-lO?  A resposta só pode ser afirmativa em todos os quatro casos.

* Eu não preciso da fé sobrenatural para saber que Deus existe. A reta razão somente diz que por trás de todas as coisas boas na vida do homem existe um Ser Sumamente Bom. A razão distorcida para fora da verdade por causa do orgulho ou obscurecida pelo pecado, pode não falar deste Ser, mas quaisquer distorções e obscurecimentos se dão por minha culpa, não de Deus, e merecem uma punição proporcional a todos os bens que eu tenho experimentado nessa vida e que eu não tenha, de modo “indesculpável” para mim (Rom. I, 20), atribuído a Deus.

*A realidade do livre-arbítrio é uma experiência diária, e cada um de nós tem a luz natural da consciência para nos dizer que devemos louvar ao Ser Supremo, e que recusar esse louvor é ofendê-lO. Tal é o Primeiro Mandamento, e não é necessário fé para que seja conhecido.           
                                                                              
*A consciência natural também me diz sobre os outros Nove Mandamentos, que simplesmente detalham a lei natural, e isso também me diz que infringi-los ofende não somente ao meu próximo, mas também, e até mesmo primariamente, ao Ser Supremo.

*E por último, quanto mais limpa é minha consciência, mais claramente ela me diz o quão seriamente eu O ofendi. O problema é que nós todos somos pecadores, e qualquer pecado ajuda a obscurecer a nossa consciência. Mas o nosso pecado se dá por nossa culpa, não de Deus, e Ele é totalmente justo ao nos punir pelo quanto obscurecemos nossas mentes.

Tudo bem - alguém pode objetar -, então a todos os homens é dado nessa vida conhecer o bastante de Deus para merecer a punição após a vida em proporção ao quanto eles O ofenderam. Mas como pode qualquer homem ofendê-lO tão seriamente a ponto de que uma punição eterna e inimaginável seja justa? Nos “Comentários” da próxima semana iremos tentar sondar um mistério que é tão profundo quanto Deus é profundo.

Kyrie eleison.

domingo, maio 12, 2013

Comentários Eleison: Mais Encorajamento



Comentários Eleison – por Dom Williamson
CCCIV - (304) 11 de maio de 2013


MAIS ENCORAJAMENTO

As notícias sobre a semana de visita à Alemanha, à França e à Suíça são encorajadoras. Certos líderes fariam bem em lembrar as famosas palavras de Abraham Lincoln: “Você pode enganar algumas pessoas o tempo todo, todas as pessoas por algum tempo, mas não todas as pessoas o tempo todo”. Poucas pessoas estão sendo enganadas o tempo todo pelo que está acontecendo na Neo-Fraternidade Sacerdotal São Pio X.
A viagem começou na Alemanha, onde algumas pessoas temeram que eu tivesse dificuldades, mas durante os quatro dias não fui perturbado de forma alguma. Um bom jovem leigo me buscou na enorme estação de trem de Frankfurt e me levou a Brilon Wald, ao norte, para nos encontrarmos com meia dúzia de Irmãs Carmelitas que se tornaram famosas no mundo da Tradição Católica por se terem separado, por todas as boas razões, da FSSPX em seu atual estado. Elas têm a mente clara, são resolutas e alegres. Como a Madre Superior me disse, a maior tristeza delas é que por 20 anos nenhuma noviça tenha perseverado com elas. As Irmãs Carmelitas não estão sendo expulsas de seu atual convento, como se tem receado, mas estão aguardando a mudança para o sul, onde terão um maior apoio local. Que Deus esteja com elas. Suas orações são preciosas para todos nós.
Em seguida fui levado de volta ao sul de Frankfurt para palestrar em uma reunião privada para uns doze adultos, a maioria homens, em um ambiente rural. À tarde eles ouviram atentamente uma análise aprofundada da crise de fundo da Nova Ordem Mundial e da Neo-Igreja, e, na manhã seguinte, uma apresentação dos problemas de primeiro plano da Neo-Fraternidade. Houve muitas boas perguntas e uma boa dose de caloroso canto dos compatriotas de Beethoven. Os pássaros da primavera nas árvores alemãs não ficam atrás de nenhum cantor profissional!
Mais ao sul, em Munique, encontrei-me com um velho amigo e os dois advogados que irão à luta por mim no meu quinto julgamento por negar o “Holocausto”, o qual deverá acontecer em Regensburgo, em setembro. Eles estão bastante cientes de que a política nacional pode tornar um veredicto justo em âmbito regional praticamente impossível, mas vão fazer o seu melhor. Precisamente porque os Seis Milhões servem como um substituto Redentor em milhões de mentes, não tive escrúpulos em remunerar os advogados a partir da Iniciativa St. Marcel, mas seus recursos se estão esgotando. Agradeço a vocês toda e qualquer ajuda.
Rumo então à Floresta Negra, no sudoeste da Alemanha, onde há outra comunidade de uma meia dúzia de Irmãs, da mesma forma alegres e resolvidas a não seguir a presente desorientação da FSSPX. Fundada em 1988, elas terminaram recentemente de construir e decorar uma bela capela com cerca de duas dezenas de bancas de coro “como um sinal de esperança”, conforme seu capelão me contou. Meninas, se vocês acham que podem ter uma vocação, aqui estão dois conventos firmemente antimodernos na Alemanha onde podem tentar.
Por último, uma noite na Suíça, em um local próximo, mas desconhecido dos de Ecône, onde eles só posteriormente podem ter vindo a saber que eu passara por perto para encontrar um grupo de bons leigos; e uma noite em Paris, onde aprendi, para minha alegria, que muitos padres da FSSPX na França perderam toda a confiança na atual gestão da FSSPX. Vamos ter paciência. Deus Todo-Poderoso não é enganado por nenhum de nós.
Meu próximo compromisso é em Londres, em 19 de maio, quando deverei palestrar para os Amigos Britânicos da Palestina sobre Hamlet. Por quê? Nesta peça, Shakespeare grita de dor pela perda da alma da Inglaterra. Se a Inglaterra ainda fosse católica, não só a Palestina, mas o mundo inteiro, estaria melhor.
Kyrie eleison.

sábado, maio 04, 2013

Comentários Eleison: Declaração Doutrinal II

Comentários Eleison – por Dom Williamson
CCCIII - (303) 04 de maio de 2013



DECLARAÇÃO DOUTRINAL  -  II


Perdoem-me, queridos leitores, se eu retorno ao sétimo parágrafo da Declaração Doutrinal de 15 de abril do ano passado. A Declaração foi feita para servir como nada menos que uma base para todas as futuras relações entre a Fraternidade Sacerdotal São Pio X e Roma. Em 13 de junho (não 11) Roma recusou-a, e assim o Quartel General da FSSPX pode agora tê-la repudiado, mas ela serve para mostrar do que o atual QG da FSSPX é capaz. Sobre o sétimo parágrafo, é uma obra-prima de confusão. Esses “Comentários”, há três semanas (CE 300, 13 de abril), o explicaram, em parte, com uma dupla distinção, mas a confusão requer uma distinção quádrupla para fazer justiça. Aqui está o parágrafo completo:
Declaração III, 5: “As afirmações do Vaticano II e do Magistério pós-conciliar, com respeito à relação entre a Igreja Católica e as confissões não católicas, bem como ao dever social da religião e o direito à liberdade religiosa, e (1) a formulação de que é difícil de conciliar com as suas anteriores declarações doutrinais do Magistério, (2) devem ser compreendidas à luz da Tradição completa e ininterrupta, (3) de maneira coerente com as verdades previamente ensinadas pelo Magistério da Igreja, (4) sem aceitar qualquer interpretação dessas afirmações que possa levar a Doutrina Católica a se mostrar em oposição ou rompimento com a Tradição e seu Magistério.”
Os grifos são meus, para destacar a trapaça do parágrafo. Observe (1) como não são as afirmações do Vaticano II que são problemáticas, mas apenas sua “formulação”. Nós já estamos nos movendo para longe do que as palavras objetivamente significam. As palavras circulam de acordo com o modo como elas são subjetivamente “compreendidas” (2) ou “interpretadas” (4). Nossas mentes estão sendo induzidas a escorregar, abandonado a certeza de que uma espada deva ser chamada de espada. Não é sugerida nenhuma impossibilidade objetiva de conciliar o nonsense Conciliar com o senso católico. Eles são meramente "difíceis" de conciliar subjetivamente (isto é, nas mentes obscurecidas dos retrógrados Católicos Tradicionais).
Observe acima de tudo em (2) e (3) a sutil, mas crucial escorregada de “à luz da” para “de maneira coerente com”. O verdadeiro entendimento das novidades do Vaticano II “à luz da” Tradição é entender que eles são totalmente irreconciliáveis. Entendendo-os “de maneira coerente com” a Tradição é entendê-los como se eles fossem conciliáveis. Nossas mentes são feitas para escorregar novamente, porque “à luz da” e “de maneira coerente com” não significam a mesma coisa. Com certeza, (4) qualquer entendimento subjetivo das novidades que os façam ir de encontro à Tradição e ao antiquíssimo Magistério deve ser absolutamente rejeitado.
Desse modo, a cláusula (2) pode tirar o chapéu para “tradição completa e ininterrupta”, e então (2) pode ser alinhada com o senso católico. Mas (3) sugere a bobagem modernista, e (4) traz a bobagem para casa. Assim o parágrafo como um todo constitui o mais esperto movimento passo a passo da sombra da verdade para o total erro da “hermenêutica da continuidade”, que é puro Alice no País das Maravilhas – “Palavras significam o que eu digo que elas significam”, troveja Humpty Dumpty.
Quem escreveu esse parágrafo, Deus sabe. Pode não ter sido o Superior Geral da FSSPX. Mas qualquer um que estude isso cuidadosamente pode negar que, do jeito que está, é projetado para levar mentes católicas da Verdade Católica para o erro Conciliar? Isso faz dançar as palavras tal como os hereges as fazem dançar, e hereges que fazem as palavras dançar, fazem as almas perderem a fé e caírem no Inferno. Quem foi responsável por esse sétimo parágrafo, seja anátema!

Kyrie eleison.